6.2.07
O programa segue dentro de momentos
Estive mesmo para ficar calado. E ficar calado a assistir tem sido o meu melhor atributo. Mas, sendo pai, não pude deixar de me sentir envolvido e, como tal, com a legitimidade de tagarelar um pouco acerca da matéria que se segue. Tenho suposta e alegadamente quatro filhos. Definitiva e comprovadamente de quatro mães. E, o suposta e alegadamente citados, fundamento-os porque o primeiro filho tem o meu nome, o segundo não e só o reencontrei dezassete anos depois (já com família e pontualmente com outra paternidade adjudicada), a terceira filha voltou a ter o meu nome e o quarto ainda vamos a caminho do Instituto de Medicina Legal para confirmação dos factos genéticos e das posteriores e inevitáveis conclusões de progenitura. E o que decidi eu acerca da existência destas quatro vidas? Rigorosa e literalmente nada. Todas as mães me disseram o mesmo: “esta criança eu vou tê-la!” E caluda ó machos interventivos, do sim ou do não da interrupção deste domínio, que por muito que aprendam a tricotar, grávidos é que não ficam. Quanto a meter plural em coisa unilateral é duma soberba machista desfazada de bom senso. Desde quando uma opinião tem a validade de uma decisão? E é só a opinião, o que podemos emitir. E muito por isso mesmo, desde quando uma opinião tem poder deliberativo e direito a sufrágio? Não somos decididamente achados para a coisa, que é como quem diz: “dá cá o espermatozóide e cala-te ó meu lindinho que do resto vou tratar eu!” Nem mais. Abençoadas as mulheres pelo facto de serem plenipotenciárias. Isto não nos reduz em nada, nem nos promove em algo mais, excepto nos desígnios da intervenção posterior pelas vidas em evolução, mas pelo contrário pôe-nos no caminho irrevogável do imediatismo: o de ficarmos calados e inevitavelmente acatar o que a mãe decidir. E, depois disso, o de sermos responsáveis pelo envolvimento nesse facto inovador e empreendedor da nova vida, ou demolidor e de cumplicidade no rejeitar da mesma. A responsabilidade de uma nova vida é o bastante para ficarmos mobilizados para o resto da nossa existência. Sem mais. E é correcto que assim seja. Uma vida nova é uma única e original odisséia com budget comprometido para os anos vindouros e futuro teoricamente comprovado para o resto dos nossos dias. Não ponhamos mais política ou filosofia no evento e que as religiões se resumam às orações. E a ciência que deixe de ser lenta para asseverar as certezas que nos faltam. Basta o que basta. Sejamos atentos e eficazes com a tarefa que nos compete. E essa, irrefutavelmente, é de obrigatoriedade para o domínio dos pais que têm a sua função adjudicada. Afinal o que se vai votar já de seguida? Opinemos já que, atrás comprovado, mais nada nos resta. E seria de mau tom apurar-se, posteriormente ao referendo, que o mesmo se decidiu com excesso de peso masculino. Este referendo deveria ficar circunscrito às mulheres e ponto final. Como pode a turba masculina ter direito a voto e como tal decisão na matéria? Como podem as religiões falar do direito da vida, excomungando os direitos da vida empreendedora? Como se podem tirar dividendos políticos de questões tão pessoais e intransmissíveis? Que a ciência me perdoe quando afirmo que em tempo útil (e esse, a mesma que o defina peremptoriamente e com rigor qual a validade dos meios de interrupção), todo o processo inerente pode ser reversível. E deve sê-lo quando compromete a liberdade e o equilíbrio da vida progenitora. As mulheres e tão somente, votem sobre o assunto. O voto a quem decide de facto! Agora, o que é que eu penso e não vou votar acerca do assunto? Eu explico, na perspectiva do homem comum e com pitada de lucidez. A lei vigente é uma farsa com muito maus resultados. As classes desfavorecidas não podem e muito menos devem ter este castigo adicional da penalização do aborto. Portugal tem de deixar de ser mais uma anedota europeia neste domínio. Deus, penso eu, só deseja filhos felizes, realizados e desejados neste mundo. A medicina existe, arre e apenas, para evitar o sofrimento (e venha posteriormente a eutanásia). Adoro os meus pais pela decisão que tiveram e não estaria cá para rejeitar a outra também possível. E já agora, desculpem se existo...