6.5.08

 
CARO SENHOR. POBRE E CORAJOSO SENHOR. O senhor é uma experiência do Criador do Universo. É a única criatura de todo o Universo que dispõe de livre arbítrio. É a única que tem de calcular o que fazer a seguir… e porquê. Todos os outros são robots, máquinas. Ao que parece algumas pessoas gostam de si, outras odeiam-no e deve interrogar-se sobre este ponto. Eles não passam muito simplesmente de máquinas de gostar de odiar. Sente-se confuso e desmoralizado. É perfeitamente natural. Não há dúvida que é cansativo ter de raciocinar continuamente num universo que não foi feito para ser racional. Encontra-se rodeado por máquinas de amar, máquinas de odiar, máquinas insaciáveis, máquinas altruístas, máquinas corajosas, máquinas cobardes, máquinas divertidas e máquinas graves. O único objectivo destas consiste em perturbá-lo de todas as formas possíveis, a fim de que o Criador do Universo possa observar as suas reacções. Têm possibilidades de sentimento e raciocínio iguais às dos relógios antigos. O Criador do Universo gostaria de apresentar as maiores desculpas não só pelos caprichos e opressões que providenciou durante o teste mas também pelas péssimas condições apresentadas pelo próprio planeta. O Criador programou robots, a fim de que o poluíssem ao longo de milhões de anos, para que quando o senhor chegasse não passasse de um queijo venenoso e deteriorado. Certificou-se igualmente de que estaria povoado de robots programados que independentemente das condições de vida adorariam mais do que tudo as relações sexuais e os filhos. Também programou robots para que escrevessem livros, revistas e jornais para si, e organizassem programas de rádio e televisão, bem como teatro e cinema. Escreveram canções para si. O Criador do Universo forçou-os a inventarem centenas de religiões a fim de lhe dar inúmeras possibilidades de escolha. Fez com que se matassem uns aos outros com esta finalidade única: a de o surpreenderem. Cometeram todas as atrocidades possíveis e todos os altruísmos possíveis insensivelmente, automaticamente e inevitavelmente a fim de conseguirem uma reacção S-U-A.

Kurt Vonnegut Jr.
In “Pequeno almoço de campeões”





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