3.6.08

 
The song remains the same...

Sabes bem que mantenho uma ideia há trinta anos. Sim que as ideias só nos chegam finalmente aos fatídicos dezasseis anos, porque antes não sabemos sequer o que sejam. E para mais tendo esta sido herdada às mãos de meu pai, que em pequenas doses e algumas conversas ma transmitiu no seu esplendor. Pois eu decidi ficar, por herança e descoberta, com esta mais brilhante ideia de então. Essa mesma, é claro. Nunca a mudei. Mudou tudo, isso sim. O mundo, o cabrão do tempo, meteorológico ou não, a velhice nos rostos e ideias dos outros, as contas bancárias dos mesmos, etc. A minha ideia não. E especialmente tu que me conheces há trinta anos, sabes bem que as ideias não mudam. Mudam as circunstâncias, as prioridades, objectivos e outra tanta carrada de merdas que vez nenhuma interessaram ao mundo das ideias. Mas nunca assim para a essência imutável das ideias. É que esta ideia sou eu, e eu sou imensamente mais eu, dentro da ideia. Sempre fui teimoso. Já faz trinta anos assim mesmo. Deu imenso trabalho transportar tanto tempo a mesma ideia. Aconchegou-se a mim e anquilosei-me a ela. E agora unos e indivisíveis, o que havemos de fazer? Obviamente prosseguimos. Não sei se é uma boa ideia. Mas é minha, muito minha, linda menina. Sorrio sem motivo de manhã quando a tenho. Adormeço embaraçado nos seus gestos. E tu sabes perfeitamente que ainda não perdi a capacidade de amar, até os estupores dos seres que por aqui andam a povoar cada metro quadrado. Tivessem eles sempre a sua ideia, tivessem eles pelo menos uma vez uma ideia e presumo seria melhor o mundo. O tal que muda. Mas todos mudam afinal, mesmo com ideias, os sacanas. E eu leal e fiel à minha ideia, sem mudar, sem avançar e sem recuar, se calhar sem envelhecer. Pois, que a biologia, parece-me, é indiferente a esta coisa das ideias. A ideia, no entanto, por vezes faz-me sentir orfão. Deprimido. Inconsolável. Sózinho. Injustiçado. Revoltado. Mas sei que é a melhor ideia possível. Foi baptizada liberdade por todos os que já a idealizaram. Liberdade, assim mesmo de seu nome próprio. Bem vês que nunca mudei. Até em relação aos mestres que tive à distância. Almada Negreiros já o dizia, em profunda resistência, que “a liberdade é uma palavra que sobe”. E a evidência é subir para quem não sabe pactuar com o lodo.





<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?

hits online